[Eu Se] Prólogo

Eu Se Hyun era uma garota atraente, teve uma boa educação e vinha de uma família de prestigio, já que seu pai era um diplomata. Toda sua vida foi moldada para ela se adequar aos padrões coreanos. Uma boa garota deveria ser respeitosa com seus pais, deveria ser independente e aguardar a família escolher um bom marido, além de ter algum talento. Tudo isso existia na vida de Eu Se, mas aonde estava a verdadeira felicidade?

Ela era grata por tudo que tinha, mas no fundo sabia que essa não era a vida que ela gostaria de levar. Pelo menos uma vez na vida, ela gostaria de largar a pressão imposta a ela e viver como uma menina de 16 anos. Com um suspiro resignado, Eu Se entra em casa e percebe que não havia ninguém. Ela caminha em direção ao quarto, mas ao passar pela sala percebe que a TV esta ligada.

-Ohma?? (Mãe)

A garota se aproxima do sofá e vê sua mãe dormindo, ela puxa a manta do sofá para cobri-la e acaricia seu rosto. Eu Se sabia o quanto sua mãe estava triste por ela partir. As duas eram bem próximas, devido a ausência frequente do pai.

-Bianeyo Ohma (Me desculpe mãe)

Mas somente dessa vez ela seria egoísta e pensaria em sua própria felicidade. Ela caminha em direção ao seu quarto, estava ansiosa aguardando a resposta da gravadora. Sua suposta viagem para a Inglaterra já estava marcada. Só restava ela rezar para que fosse chamada logo.

Spoiler:

A mãe da garota não ouviu o pedido de desculpas, mas a voz da menina pareceu ativar alguns instinto materno, pois ela se remexeu no sofá e respirou profundamente, murmurando meio confusa enquanto despertava.

- Hm? Eu Se... você já chegou? Que bom... 

Sentou-se devagar e colocou a mão no rosto, um pouco desnorteada de sono. Era um tanto raro ver a mãe fragilizada daquela forma, exceto pela última semana, mas era o preço a aguentar por um sonho. A programação da TV fez a mãe ter um pouco mais de noção de horário e até ela ficou surpresa.

- Eu dormi tanto assim? 

Em seguida esbarrou a mão na manta, então fez uma pausa, percebendo o carinho que a filha teve em fazer isso por ela. Foi tomada por uma antecipação de saudade e respirou fundo. Olhou rapidamente para a filha, com doçura no rosto, mas uma pequena tristeza que ela já reconhecia desde a primeira vez que comentaram sobre a Inglaterra. A mãe disfarçou olhando para a pequena bagunça na mesinha de centro, onde tinha uma xícara de chá pela metade que há muito não fumegava. Ao lado, havia uma revista entreaberta e uma pilha de papéis. A mãe geralmente separava a correspondência entre lixo e o que deveria ser de interesse do pai, para arquivar para ele.

- Nossa, eu não fiz nada hoje, que vergonha. Eu já vou arrumar alguma coisa para comermos. Espere um pouco.

Ela pegou a xícara e levou para a cozinha, acendendo as luzes da casa no processo enquanto tentava desviar suas preocupações com uma conversa trivial.

- Como foi o seu dia? 

Enquanto ela ia em direção ao quarto, sua mãe acaba despertando da pequena soneca no sofá. Eu Se sente um peso no coração, não gostava de fazer a mãe sofrer e por um momento pensou em lhe contar toda a verdade, mas não teve coragem. A garota se aproximou da mãe e a abraçou pela cintura.

- Saranghae (Eu te amo)

Ela abraça a mãe bem apertado, mas logo ela se solta e sorri radiante enquanto caminham juntas para a cozinha.

- Gwenchana (Está  tudo bem)

Eu Se prende o longo cabelo num rabo de cavalo e começa a cortar alguns legumes para ajudar sua mãe a fazer a janta.

-Appaneun jeonyeog sigsa-e oneun?(O papai vem jantar?)

A mãe parou naquele abraço e até fechou os olhos por alguns segundos, abrindo-os com muita ternura e finalmente uma alegria que não era forçada. Era simplesmente amor, que não necessariamente era dito em palavras, mas era completamente sentido no rosto transparente dela e no abraço retribuído.

Visivelmente mais alegre, ela lavou a xícara e pegou os outros ingredientes na geladeira: ovos e carne. Provavelmente um bulgogi improvisado, já que queria terminar logo. Quando perguntou sobre o pai, a mãe respondeu em um tom aéreo:

- Mais uma reunião, querida. Não há hora certa para chegar.

Isso significava que ele não apareceria e que a mãe não fazia a menor ideia de onde ele estava de verdade. O motivo de ter encontrado a mãe naquele estado provavelmente já estava explicado ali. Ela ficou algum tempo parecendo totalmente concentrada na cozinha, mas com os pensamentos bem longe dali.

- Seu pai e eu vamos ficar tristes quando for para a Inglaterra. Seu pai também está sofrendo bastante, se enchendo de trabalho… mas eu entendo, é claro.

Comentou quase sem querer, não esperando resposta. Eu Se estava acostumada com o que a mãe estava fazendo agora. Como a comunicação entre os dois não era das melhores, ela muitas vezes jogava os sentimentos dela em falas fictícias do pai, quando na realidade, se fosse perguntado, ele talvez nem soubesse do que estavam falando.

- Eu estava pensando se eu não deveria aprender a fazer como o seu pai, quando ele fala com o trabalho dele pelo computador…

Ela estava se referindo a chamadas do Skype. Nunca foi de seu interesse mexer nesse tipo de coisa tão “avançada”. Não era como se tivesse várias amigas internacionais. Uma conferência estava bem longe de ser algo útil para uma dona de casa.

- Ah, bobagem, você provavelmente vai estar muito ocupada nos estudos, não é? - riu sozinha. - Isso, querida, já está ótimo. Se quiser, eu te chamo quando terminar aqui.

As duas estavam na cozinha conversando informalmente. Ela sempre ajuda a mãe com alguns afazeres de casa, esse era a maneira delas estarem sempre próximas. E não era novidade nenhuma jantarem sozinhas, Eu Se lembra da presença do pai na infância, mas desde que entrou no colegial o matrimônio ruiu e hoje eles tem um casamento de aparência.

O que mais incomodava a garota era o fato da mãe inventar desculpas pra acobertar o pai, ela vivia fazendo isso. Sinceramente as duas viviam uma vida repletas de mentira e da mesma forma que ela queria fugir dessa realidade, achava que sua mãe gostaria de fazer a mesma coisa.

- Aigooo.... Uneun geulaeseo hyeondaee dochaghaess-eul ttaebuteo? ( Meu Deus... Desde quando você ficou tão moderna?)

Eu Se sorria alegremente, sempre tentou incentivar a mãe a ter um celular mais moderno, mas ela nunca teve interesse. Sabia que a mãe ficaria muito solitária sem ela por perto.

-Nan dangsin-i jeonyeog sigsaleul jegong han hu idonghaneun bangbeob-eul galeuchyeo
(Te ensino a mexer depois da janta)

Como não tinha mais nada a fazer na cozinha, ela lavar as mãos, dá um beijo na bochecha da mãe e vai em direção ao seu quarto.

A mãe riu quando foi chamada de “moderna”, estava se sentindo bem esperta por ter tido aquela ideia. O casamento era ruim a ponto de, em casa, o marido continuar trabalhando e uma das coisas que ela mais odiava era a tal da videoconferência. Quem diria que agora usaria a seu favor? Era um motivo de orgulho para a mulher.

Isso elevou seu espírito mais uma vez e ela até sorriu para as ervas que usava para temperar a carne.

- Obrigada, querida. Saranghaeyo.

Ela sorriu novamente após o beijo e permitiu que a filha fosse para o quarto enquanto terminava a janta.  Eu Se podia finalmente relaxar em seu quarto. Ultimamente seus momentos sozinha eram uma oportunidade de planejar  ideias para viver seu sonho, além de ter a sensação de que poderia escapar momentaneamente da mentira que existia em volta daquela casa, agora, inevitavelmente, mais ainda. Uma resposta da empresa e tudo mudaria.

Como um tipo de brincadeira dos céus, o celular da menina vibrou com uma nova mensagem. Era Cho Ja-Young, uma amiga da escola. Ou melhor dizendo, a garota que sentava a seu lado na classe, uma boa colega, de família rica e que por acaso acabou virando uma fã de carteirinha de seu talento na música. Era uma ótima fofoqueira, colecionadora de idols e extremamente expansiva. Tinha o celular de todo mundo da sala, muitos crushes, mas nenhum namorado. Ela era considerada gordinha, mas todos falavam com ela porque os pais davam grandes festas para a escola toda.

[[Eu Se, adivinha quem vai p a TV? ★.★ ]]

As mensagens continuavam.

[[ ㅎ_ㅎ  Min-soo-oppa no KPOP SHINE   ]]

Minsoo era um garoto mais velho, que a menina insistia em chamar de "oppa" secretamente. Era bastante atraente e gentil com absolutamente toda a escola, o que fazia com que as garotas gostassem muito dele. Era de conhecimento geral que ele gostava de compor.

Isso significava duas coisas.

A primeira é que as chamadas estavam mesmo sendo feitas e ela ainda não tinha recebido nenhuma.

A segunda é que ao por os pés no concurso, existia a possibilidade real de lidar diretamente com alguém capaz de reconhecê-la.

[[To no chão.
Estudei com um idol.
Me ajuda
ㅋㅋㅋ  ]]

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off: é opcional se ela contou ou não para essa garota, mas estou assumindo que não.

Assim que chegou no quarto Eu Se se joga na cama de casal. Gostava de ficar sozinha em seu quarto, pois era um lugar amplo e bem iluminado. Havia uma cama de casal, uma escrivaninha com o laptop em cima e um teclado de música  bem moderno, que gostava de tocar nas horas vagas.

Ela sente o celular vibrando no bolso e percebe que tinha chegado uma mensagem, era de uma colega de classe. Elas não eram muito próximas, mas gostava da garota e sentia pena ao mesmo tempo, pois sabia que muitas pessoas só se aproximam dela por interesse.

- Mwo!?!?....Ottŏke???? ( O quê !?!?.... O que eu faço????)

Eu Se senta na cama com um pulo. Não podia acreditar naquilo, ela lê a mensagem mais uma vez. Min Soo Oppa no KPOP Shine. Ele é muito popular na escola, todas as meninas gostam dele. Até mesmo ela já teve uma quedinha por ele.

Se ela fosse chamada para audição, teria que tomar um cuidado redobrado. Não poderia deixar que seu disfarce fosse descoberto. Muito aflita ainda, a garota manda msg para seu amigo de infância, Go Min Nam. Até ano retrasado eles viviam no mesmo bairro, mas então sua família foi a falência e eles se mudaram para o interior. Go Min Nam era o único que sabia e apoiava seu sonho de tocar numa banda pop, ele até concordou em fazer a inscrição em seu nome para que ela pudesse participar do reality show. Eu Se escreve uma msg às pressas devido ao nervosismo.

- Oppa..Ottŏke??? Oi Min Soo peulo peulogeulaem bulleossda

( Oppa... O que eu faço??? Min Soo foi chamado para o programa.)

A garota andava para cima e para baixo no quarto, já havia mandado a mensagem fazia alguns minutos e nada de resposta. Estava começando a roer as unhas quando a primeira mensagem chegou. Então ela senta na cama e aguardou as próximas mensagens chegarem.

Ela sempre achou seu amigo mais sensato que ela, já que a menina costumava agir por impulso. Ele deu um bom conselho, deveria evitar de se encontrar com ele a qualquer custo. E havia o problema do programa ser televisionado. Teria que manter o máximo de cuidado, isso caso ela recebesse a aprovação.

- Komaweoyo...Niga chwi go ne!

( Obrigada...Você é um bom amigo!)

Eu Se se sente um pouco mais confiante. Ao olhar para o espelho ela ergue o pulso para se auto encorajar.

- Fighting!!!!( Força!!!!)

Ela escuta sua batendo na porta a chamando pra jantar, então não demora muito para sair do quarto.

A garota ajudou sua mãe a lavar e a secar a louça e sorriu ao ver a empolgação da mãe por causa de uma coisa tão simples. Ela foi para a sala e sentou no sofá. Quando ela viu o nome Go Min Nam, sentiu seu coração bater mais rápido. Pois sua mãe não podia ver aquela carta ou seus planos estariam arruinados.

- OHMA!!! Dangsin-eun danjeong han daeeung naleulhadolog hal su issseubnida.
( MÃE!!! Pode deixar que eu arrumo a correspondência.)

Eu Se sorri e começa a recolher todos os papeis da mesinha, incluindo a carta do reality show.

- Nae noteubug-eulbad-eul su issnayo? Geogi hwasang hoeuileul mandeulgi wihae swibge (Você pode buscar meu laptop? Fica mais fácil de fazer a videoconferência por lá.)

Ela espera que sua mãe entre no quarto para esconder a carta no bolso. As propagandas ela joga fora e as cartas importantes ela deixa sobre o criado mudo da sala. Depois volta a sentar no sofá e aguarda sua mãe chegar, tentava parecer calma e agir naturalmente. Mas estava ansiosa para ler a carta.

A mãe levou um susto com a reação da menina e olhou muito surpresa para ela, sorrindo em seguida. Atribuiu claramente ao fato de ter dormido e a filha estar preocupada com o fato de deixá-la sozinha em breve.

- Que prestativa, Eu Se. Ah, muito obrigada. O seu computador? Claro, vou buscar.

Ela saiu concentrada, distraída com o fato de que aprenderia uma tarefa nova. Enquanto isso, Eu Se estava concentrada também, na carta endereçada a sua identidade secreta.

Não levou muito tempo para voltar e agora talvez ensiná-la parecesse uma boa ideia, mas seria malvado tirar o doce da boca da criança dos olhos dela, que estavam ansiosos para aprender a se comunicar com a filha à distância. Eu Se precisou reunir toda sua paciência para explicar, mais de uma vez, como fazer a tal da chamada, enquanto o papel parecia chamá-la constantemente. Talvez a mãe tenha notado a ansiedade da garota então decidiu anotar os passos e quando finalmente a sala apareceu na conexão entre celular, a tarefa estava concluída.

- Isso é fantástico! Gomawo (Obrigada), querida! - ela estava vidrada na imagem que aparecia na webcam. - Agora poderemos nos falar mesmo quando estiver longe - juntou as mãos, feito criança. - Desculpe por tomar o seu tempo, mas fiquei feliz. Vou treinar com o celular. Gomawo! - abraçou e beijou a filha por fim, bastante alegre. Ficaria treinando na sala, até que sua novela favorita começasse.

A garota poderia finalmente devolver o computador para seu quarto, onde estaria livre para curar sua curiosidade:

Spoiler:

Eu Se Hyun ensinou sua mãe o máximo que conseguiu, apesar da ansiedade de ler a carta, ficava feliz em ve-la tão empolgada com algo. Depois que terminaram, a garota desligou e fechou seu laptop.

- Anieyo, Omani.
( De nada, mãe.)

Ela sorria enquanto pegava suas coisas e ia em direção ao quarto. Sabia que a mãe ficaria entretida durante um tempo. Assim que ficou sozinha ela abriu a carta e leu 3 vezes para ter certeza.


-  OMO....Naegaisseo....Naegaiss-eo
(Meu Deus.... Eu consegui... Eu consegui)

A garota falava baixinho, mais para si mesma enquanto abraçava a carta. A felicidade era tanta que ela não conseguiu conter o impulso de ficar dando pulinhos pelo quarto.

Eu Se fez todos os preparativos para a suposta viagem. Fez sua mala, pegou seu passaporte e tudo que achou levar necessário para a Inglaterra, incluindo seu teclado. Sua mãe parecia estar mais atarefada do que o normal, preparou várias marmitas para que a filha não passasse fome na viagem.

No dia do embarque ficou um pouco chateada pois o pai não estava presente. Ela ouviu a discussão por telefone na noite anterior, então não esperava mesmo que ele aparecesse.  Ela abraçou bem forte a mãe antes de entrar no táxi.

-  Sarangahe. ( Eu te amo)

Assim que o carro virou a esquina de casa, ela pediu para o motorista a levar para um shopping no centro de Seul. Lá havia muitas lojas de roupa e um salão de beleza bem moderno. A garota tinha tempo antes da audição. Então deixou sua mala num dos cofres, assim sua mala ficaria protegida. E começou a caminhar pelo shopping na seção de roupas masculinas. Quem visse ia achar que era uma menina comprando roupas para o namorado.

Então ela por fim entrou no salão de beleza e escolheu um corte de cabelo da revista, mesmo as cabeleiras ficando surpresa com a escolha. Eu Se Hyun, pagou bem acima do valor, para que ninguém revelasse seus planos. Mas a garota não pode conter algumas lágrimas quando suas longas madeixas caiam no chão.

Spoiler:

Após algumas horas no salão, Eu Se havia se transformado em um garoto. Pelo menos era o que todos achavam ao ver ela caminhando pelo shopping com uma nova mala. Desse jeito Eu Se não existia mais e agora ela seria conhecida como Go Min Nam.